Roger Eno: "Queria criar um álbum que implementasse a transitoriedade, a passagem das coisas e manter uma distância com o 'mundo quotidiano'"


23 de Novembro, 2022   /   273
Auditório de Espinho | Academia

Roger Eno, músico e compositor britânico, lançou o seu primeiro álbum a solo com o selo da Deutsche Grammophon, The Turning Year, este ano. Em 2020, pela primeira vez, gravou o primeiro disco exclusivamente com o seu irmão, compositor e produtor, Brian Eno, intitulado Mixing Colours. Além disso, colabora com vários artistas e, ocasionalmente, compõe bandas sonoras para filmes.

Passam sete meses desde o lançamento de The Turning Year e é ao Auditório de Espinho | Academia que o vem apresentar, no âmbito do festival itinerante Misty Fest, esta quinta, 24 de novembro, pelas 21h30. Hoje, em entrevista, Roger Eno apresente o álbum com palavras.

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Como surgiu este projeto a solo?

Como sempre, desejei lançar um disco unificado em que as peças estivessem relacionadas umas com as outras - queria criar um álbum que implementasse a transitoriedade, a passagem das coisas e manter uma distância com o "mundo quotidiano". Desejava investigar aspetos do meu interior - e, talvez, do interior dos outros.

Sobre o nome do álbum The Turning Year. Que viragem é essa? Foi um acontecimento que provocou um momento de viragem? Ou é sobre a mudança de ano, por exemplo, de 2021 para 2022?

É, parcialmente, cronológica, mas não se baseia no 'tempo do relógio' – é sobre o desaparecimento e reaparecimento das estações, da memória e das memórias, tem a ver com o meu próprio interesse pela história (ou pelo passado) como uma força frequentemente escondida nas nossas vidas do presente.

Li, no seu website, que o seu processo criativo passa pela “decomposição”. É o The Turning Year também uma decomposição das facetas em que/com que vivemos e uma decomposição de histórias?
"The Turning Year é como uma coleção de contos ou fotografias de cenas individuais, cada uma com a sua própria personagem, mas, de alguma forma, intimamente relacionadas umas com as outras. Estas peças permitem-nos, talvez, pensar em como vivemos as nossas vidas com facetas, como caminhamos através delas, como temos vislumbres fugazes, como percecionamos the turning year ". - Roger Eno

No meu processo criativo, a 'decomposição' retira e edita o que muitas vezes são improvisações gravadas - utilizo o silêncio como instrumento e/ou declaração e, muitas vezes, é fácil, no início, 'dizer demasiado'. Assim, apago notas e talvez fases que não são inteiramente necessárias. Isto tem dois efeitos benéficos: o primeiro é que as peças são muito mais desordenadas e, felizmente, desprovidas de demonstrações inúteis de virtuosidade (ou ego) e, em segundo, convida o ouvinte a participar no processo de composição, uma vez que os silêncios permitem que os próprios pensamentos sejam ouvidos. 

O piano é uma espécie de narrador - conta uma história em cada música. Se o piano é o narrador, pode o conjunto de cordas ser considerado como personagens destas histórias?

Estou muito consciente das possíveis implicações "políticas" da escrita de música. É possível criar uma dinâmica 'Mestre/Servente', onde toda a orquestra se subordina, digamos assim, a um violoncelo ou a um instrumento a solo. É, igualmente possível, escrever música que se esforça por uma certa igualdade dentro da orquestra e, de um modo geral, é com esta última que me sinto mais à vontade. Desenvolvi uma técnica de composição em que o compositor se limita a escrever uma série de notas e encoraja os músicos a transformá-las numa peça única. Isto é feito por um consenso não verbalizado, ouvindo-se uns aos outros e tentando misturar-se harmoniosamente. Tenho descoberto que este é um processo libertador para os músicos habituados apenas a tocar o que está escrito numa partitura.

Portanto, tudo é narrador, tanto as cordas, como o piano. No concerto do Auditório de Espinho | Academia estará a solo. Como é estar sozinho com o piano em palco?

Sempre adorei escrever para imagens visuais - pintura, teatro e cinema - e há alguns anos atrás decidi trazer esta área para a atuação a solo. Adoro tocar a solo porque me permite vaguear inteiramente à vontade, improvisar e misturar peças umas nas outras. Acrescentando a isto, adoro o som de um piano, sustenta (aqueles 'silêncios'), a delicadeza através de um toque suave, a gama pura de frequências. É, para mim, perfeito.

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Um concerto envolvente, com um filme que passa ao mesmo tempo que Roger Eno toca, sozinho, ao piano. 

Os bilhetes para este concerto estão à venda aqui ou na bilheteira local, na Academia de Música de Espinho.

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